Curso de Homeopatia
INTRODUÇÃO
HOMEOPATIA
CONTEXTO
O estudo da história da Medicina, matéria da qual pouco (ou nada) se fala durante a formação médica, é um passo fundamental para se entender os conceitos e as práticas atuais.
De onde vem o que é ensinado nas faculdades?
Existem outras formas de se pensar a saúde, a doença e o tratamento?
Se a experiência nos mostra que há várias práticas, então, por que uma determinada prática conquistou a posição de medicina oficial?
Os povos do Oriente pensam sobre a medicina há milênios. As racionalidades médicas orientais mais importantes e utilizadas são a Medicina Tradicional Chinesa e a Medicina Ayurvedica. Essas racionalidades milenares não são ensinadas aos alunos de medicina.
Como nasceu a medicina oficial do Ocidente – aquela que é ensinada durante a formação dos médicos?
A Grécia antiga abrigou duas grandes escolas médicas nas cidades de CNIDO e COS:
– Em Cnido predominava o raciocínio analítico (decompor o todo em seus elementos constituintes).
– Em Cos predominava o raciocínio sintético (reunião dos elementos em um todo).
Tais diferenças de pensamento levam a diferentes atitudes médicas. Para o médico de Cnido o que deveria ser estudado era a doença e a forma de se intervir nela. Já para o médico de Cos o importante era entender o doente em sua totalidade e aguardar as reações naturais.
Hipócrates (460-350 a.C.), o pai da medicina, foi professor em Cós. Era um talentoso observador da natureza. Ficou famoso pelos seus aforismos, sentenças breves que transmitem seus conselhos médicos.
Provavelmente, o Corpus hipocraticus (conjunto de obras atribuídas a Hipócrates) não foi escrito só por uma pessoa, mas por um grupo de alunos do grande médico que lançou as bases da medicina ocidental.
Hipócrates se opõe à medicina mística, ensina a observar os sinais dos males que afligiam os doentes. Concluiu que a doença é um processo natural. Os sintomas são reações do organismo. Como Hipócrates (e seus seguidores) não possuía uma terapêutica sistematizada, sua principal preocupação era não atrapalhar a força imaterial que naturalmente conduz à cura.
Para o pai da Medicina, a função do médico deveria ser a de ajudar a vis medicatrix naturae, ou seja, a força natural de cura. Seus tratamentos baseavam-se em orientações comportamentais, higiênicas e dietéticas.
Hipócrates concluiu que existem três maneiras de se tratar:
-“contraria contariis curentur” (sejam os contrários curados pelos contrários) – base da Alopatia.
-“similia similibus curentur” (sejam os semelhantes curados pelos semelhantes) – base da Homeopatia.
-“vis medicatrix naturae” – força de cura natural, a defesa do organismo.
Esses caminhos apontados por Hipócrates foram sendo usados e comprovados ao longo da história da medicina.
O maior nome da Medicina após Hipócrates é o de Galeno (138 – 201 d.C.). Grande anatomista e fisiologista. Foi médico dos gladiadores. Não aceitava a concepção hipocrática de “poder curativo da natureza”. Concebia o corpo humano como um instrumento da alma. As doenças eram, para ele, localizadas em órgãos do corpo. Para ele toda alteração correspondia a uma lesão em algum órgão. Propagou o método de cura pelos contrários, mas reconhecia a existência do método dos semelhantes. Seus pensamentos dominaram a medicina durante séculos.
Como veremos são dois tipos de visão que predominam na história da medicina: o Mecanicismo e o Vitalismo. Grandes médicos ora defendem uma concepção, ora a outra.
Os mecanicistas viam o homem como uma máquina, a doença como um defeito da máquina e a tarefa do médico como o conserto da máquina. Tal visão, baseada na filosofia grega, tem seu ápice na filosofia de René Descartes e na física newtoniana.
Os vitalistas, por sua vez, conservaram a visão de totalidade do ser vivo, viam a doença como um desequilíbrio da força imaterial que mantém a vida.
No período do renascimento destaca-se o nome de Paracelso (1493 – 1541 d.C.), o médico dos pobres. Indignou-se com a medicina de sua época e queria reformá-la. O verdadeiro médico, para ele, deveria basear- se na observação da natureza e não divagar em textos sem fim como fizeram Hipócrates e Galeno.
Paracelso aceitava a Força vital conforme o ensinamento de Hipócrates, mas ao contrário deste, não se limitava a aguardar a reação do organismo, buscava meios de estimular a força vital. Com sua doutrina das assinaturas, Paracelso administrava substâncias que tivessem características (cor, forma, odor e sabor) semelhantes aos sintomas e órgãos afetados dos doentes. Por exemplo: a flor da Eufrásia é semelhante a íris, portanto era recomendada para doenças dos olhos. A cor amarela da açafroeira a tornava indicada para tratar a icterícia (coloração amarelada da pele e mucosas).
No século XVII surge Thomas Sydenham (1624 – 1689). Foi chamado de Hipócrates britânico. Também defendia a observação da natureza como base para a medicina. O dever do médico, para Sydenham, era ajudar a força vital a manter o equilíbrio, por isso os tratamentos que usava eram as orientações higiênico-dietéticas, tal como Hipócrates fazia dois mil anos antes.
No século XVIII predominavam os tratamentos mecanicistas, que visavam eliminar do corpo aquilo que estaria causando a doença.
Os métodos empregados eram: a sangria (retirada de sangue usando-se ventosas, sanguessugas e lancetas), administração de substâncias que causassem diarréia e vômito, além de irritativos sobre a pele. Acreditavam estar, desta forma, eliminando as impurezas.
O final do século XVIII e o início do século XIX são marcados pelo nascimento da Homeopatia com Samuel Hahnemann.
HAHNEMANN
Para Hipócrates o princípio da ética médica era, em primeiro lugar, não prejudicar (em latim: PRIMUM NON NOCERE). A medicina do século XVIII, no entanto, prejudicava e muito os doentes. Tratava-se de uma medicina iatrogênica.
IATROGENIA: sofrimento causado por uma ação médica.
Neste contexto surge o médico alemão SAMUEL HAHNEMANN (1755-1843), que exerce a profissão até os 34 anos, quando decide abandonar a carreira por insatisfação com os efeitos nocivos da prática médica.
Hahnemann conhecia vários idiomas, por isso, para sustentar sua família, dedica-se à tradução de obras de grandes autores da medicina.
Nessa época germina a ideia de experimentar a ação de substâncias sobre os homens saudáveis.
Após traduzir um texto do Dr. CULLEN sobre a Quina (droga usada contra a malária), Hahnemann discorda das explicações fornecidas pelo autor e decide experimentar em si mesmo a substância. Percebe, então, o surgimento de sintomas semelhantes aos da malária, restabelecendo sua saúde ao parar de ingerir a droga.
Formula a hipótese de que a Quina promove melhora dos sintomas dos doentes com Malária porque provoca, em pessoas saudáveis, sintomas semelhantes aos da Malária. Hahnemann sabia que essa hipótese não era dele, Hipócrates e vários outros autores já haviam sugerido que os semelhantes curam os semelhantes.
Porém, coube a Hahnemann a comprovação e a sistematização dessa lei de cura. Decide experimentar, em diversas pessoas saudáveis, várias substâncias conhecidas pela medicina da época. Os resultados dessas primeiras pesquisas foram publicados em 1796 num texto chamado de “Ensaio sobre um novo princípio para descobrir as virtudes curativas das substâncias medicinais, seguido de alguns comentários a respeito dos princípios aceitos na época atual”. Esse texto marca o nascimento do sistema médico que Hahnemann denominou Homeopatia (em alemão: homoopathie, do grego: homoios- semelhante + páthos – sofrimento).
A história oficial marca como início dos estudos experimentais em medicina o ano 1843 com CLAUDE BERNARD, porém, Hahnemann é quem inicia, 50 anos antes, uma terapêutica baseada num método experimental. Foi a primeira vez que um médico se preocupou em documentar o que ocorria no organismo após ele mesmo ingerir determinada substância.
As publicações posteriores de Hahnemann são as obras que aperfeiçoam a Homeopatia:
- “Organon da Arte de Curar”
1811-1821. “Matéria Médica”
- “Doenças Crônicas”
Hahnemann se empenhou na luta pela divulgação do sistema médico que havia desenvolvido. Sofreu perseguições e censuras, sendo obrigado a mudar de cidade várias vezes para continuar seu trabalho. Nunca desistiu de ver crescer a utilização da verdadeira Homeopatia para o bem dos doentes.
Quando Hahnemann completou 80 anos, sua esposa, com quem teve 11 filhos, faleceu. Continuou praticando a Homeopatia mesmo com idade avançada. Uma mulher francesa de 30 anos, doente de tuberculose, procura o famoso médico homeopata e, em poucas semanas de tratamento, fica curada.
A grande afinidade entre os dois acaba em casamento. Hahnemann, com 80, e Melanie, com 30 anos, mudam-se para Paris, onde a fama do mestre cresce ainda mais.
Suas curas espetaculares provocam os médicos tradicionais e a Academia de medicina francesa, que pede ao ministro do rei a expulsão de Hahnemnan. O ministro Guizot responde com este texto sempre pertinente e atual:
“Hahnemann é um sábio de grande mérito. A ciência deve ser para todos. Se a Homeopatia for uma quimera ou um sistema sem valor próprio, cairá por si mesma. Se for, ao contrário, um progresso, se estenderá apesar de todas as nossas medidas preventivas e a Academia deve desejá-lo antes de tudo, pois ela tem a missão de fazer avançar a ciência e encorajar os descobrimentos”.
A Homeopatia se consagrou na França e, depois, se espalhou pelo mundo. Hahnemann trabalhou até 1843, quando morreu aos 88 anos de idade.
O ORGANON
O livro ORGANON DEL HEILKUNST (Organon da arte de curar), publicado na Alemanha em 1810 de autoria de Hahnemann, é referência obrigatória para quem se interessa por Homeopatia. No total, foram seis edições nas quais Hahnemann foi aperfeiçoando seus ensinamentos. Não é o livro que inaugura a Homeopatia. Em 1796 (catorze anos antes do Organon) o autor já havia publicado sua idéia de experimentar substâncias em homens saudáveis, porém, sem dúvida, o Organon é seu livro mais importante.
Uma obra densa e rica, de impressionante atualidade e que contém todos os fundamentos teóricos da Homeopatia. A leitura atenta dessa obra deve levar em consideração o contexto histórico de sua elaboração – início do século XIX.
O nome “Organon” vem do grego e significa “instrumento”. É também o nome dado por Aristóteles ao seu conjunto de tratados sobre lógica. Interessante ressaltar que Hahnemann não batiza seu livro de Organon da Homeopatia, mas sim de “Organon da Medicina” (arte de curar).
Na verdade, os resultados incrivelmente superiores da Homeopatia, em contraposição com as práticas nocivas do século XVIII, obrigaram Hahnemann a reconhecer como única a nova medicina que ele havia desenvolvido.
Assim, em todo o “Organon” encontramos referências à “antiga escola”, ou seja, às práticas alopáticas de seu tempo, cuja evolução viria a constituir a medicina oficial contemporânea.
HOMEOPATIA: termo criado por Hahnemann em sua obra “Organon da arte de curar” para designar o sistema médico baseado na lei dos semelhantes (“similia similibus curentur”).
ALOPATIA: (do grego: alloion – diferente + pathos – sofrimento) termo criado por Hahnemann para designar a medicina oficial de seu tempo. Emprega remédios de ação diferente da doença que se visa tratar.
ENANTIOPATIA: (do grego: enantio – contrário) baseada no princípio dos contrários (“contraria contrariis curentur”). Utiliza remédios de ação oposta à enfermidade natural. São exemplos desta terapêutica os medicamentos “anti”: antibióticos, anti-inflamatórios, analgésicos, antiespasmódicos etc. Confunde-se com a Alopatia.
ISOPATIA: (do grego: isos – igual) método terapêutico que utiliza (para curar ou prevenir) o mesmo fator que aparentemente é a causa da doença. São exemplos: as vacinas e os soros.
TAUTOPATIA: (do grego tautos – o mesmo) método terapêutico usado em algumas intoxicações. Consiste em usar doses menores da própria substância que intoxicou o organismo.
A medicina convencional, a qual chamamos de medicina oficial ou Alopatia para continuar usando a denominação dada por Hahnemann, utiliza, na verdade, os métodos alopático, enantiopático, tautopático, isopático e até homeopático. Excluímos deste estudo a Cirurgia, conjunto de técnicas que visa tratar enfermidades ou promover correções através da atuação direta sobre o organismo.
A Homeopatia (tratamento pelo semelhante) não pode ser confundida com a Isopatia ou com a Tautopatia.
HOMEOPATIA NO BRASIL
Em 21 de Novembro de 1840 desembarcou no Brasil o médico francês Jules Benoit Mure, discípulo de Hahnemann. Foi o primeiro a divulgar a prática no país, por isso, em 21 de Novembro comemora-se, no Brasil, o dia da Homeopatia.
Contando com o apoio do imperador Dom Pedro II, Benoit Mure funda em 1844 a Escola de Homeopatia do Rio de Janeiro. Devido ao seu baixo custo e eficiência, a Homeopatia, durante o período da escravidão, foi a única forma de medicina usada pelos escravos e pelas classes excluídas. No início do século XX, a Homeopatia cresce com a criação de ambulatórios e enfermarias nas forças armadas.
Nesta época surge uma figura importante, o Dr. NILO CAIRO, que funda a Revista Homeopática do Paraná e escreve um livro de Homeopatia (ainda hoje muito difundido entre o público leigo). Em 1912, nasce a Faculdade Hahnemaniana de medicina e, em 1916, o Hospital Hahnemaniano do Brasil. A associação Paulista de Homeopatia (APH) é fundada em 1936, local onde passa a ser oferecido o curso de especialização em Homeopatia. Atualmente, em São Paulo, é a Escola Paulista de Homeopatia (EPH) que responde pelo curso de especialização com duração de três anos.
Em 1952, torna-se obrigatório o ensino de técnicas de farmácia homeopática nas faculdades de farmácia do Brasil.
Em 4 de Julho de 1980 a Homeopatia é reconhecida, no Brasil, como especialidade médica pelo Conselho Federal de Medicina. Hoje é a 16ª especialidade em número de profissionais no país.
Infelizmente, desde a introdução da Homeopatia feita por Benoit Mure em 1840, nosso país não mudou muito: persistem a miséria, a desigualdade social e o alto custo da saúde. Felizmente, também as características fundamentais da Homeopatia (baixo custo e eficiência) não mudaram.
Uma medicina preocupada com a totalidade do doente e, por isso mesmo, preventiva; uma medicina que oferece possibilidade de saúde para todos e que não depende de alta tecnologia para atingir seus objetivos; uma medicina cujo medicamento custa ao redor de US$ 3 (três dólares) e que tem por princípio a prescrição de um único remédio por vez.
Tais características fazem da medicina homeopática a mais adequada a um país como o Brasil. Por isso, vem crescendo a inserção da Homeopatia no sistema público de saúde.
Somente o meio acadêmico permanece indiferente a esta realidade. As faculdades continuam formando profissionais da saúde que não possuem o menor conhecimento das bases da Homeopatia.
Noventa e cinco por cento das escolas médicas brasileiras despejam no mercado, todos os anos, profissionais médicos que não poderão discutir outras opções de tratamento com seus pacientes. Esta postura adotada por grande parte do meio acadêmico não é apenas anticientífica, é também antiética.